Wednesday, June 10, 2020

Carlos Caseiro vai a uma comemoração.

Senta numa velha poltrona no canto da sala e evita o contato casual com outras pessoas. Num comportamento que contradiz o que se espera de alguém que vai a uma festa.

Uma luz vermelha pisca em intervalos curtos e padronizados. Jazz no vinil. A música era boa, mas Carlos Caseiro resmunga pra si mesmo que o volume estava alto.

 

"Havia dentre as mulheres da festa aquela que possuía luz própria, ela tinha cabelos ruivos e usava uma saia curta. Olhos de gata. Me pediu fogo. Ela parece gostar de mim. Mas todas parecem gostar de mim quando estou bêbado".

 

A festa não foi tão boa no final das contas. Na volta pra casa num táxi mal cheiroso Carlos Caseiro observa as pessoas na rua. Velhos bêbados conhecidos, atrapalhando o negócio das prostitutas em busca de dinheiro, jovens sem nada a perder jogando garrafas nos muros pichados.

Há incerteza nos olhos das pessoas. E  tristeza em suas almas. 

 

"No final da avenida vejo as luzes de um parque itinerante, peço para o motorista encostar o carro e faço o resto do caminho a pé enquanto fumava um cigarro e bebia o resto de uma garrafa de vinho.

A música que tocava nas caixas de som do parque oscilava constantemente devido ao equipamento velho e antigo, notavelmente bêbado, eu me sentia dentro de um aquário, as pessoas se moviam em câmera lenta enquanto balbuciavam assuntos ininteligíveis.

O caos era a ordem.

Crianças usavam armas enquanto atiravam em patos para ganharem chaveiros com escrito LOVE, o trem fantasma não metia medo em ninguém, a violência no trânsito era justificada no bate-bate. A Maçã do amor machuca os dentes.

Existe contraste no mundo.

Pessoas ricas e pessoas pobres. Liberdade e opressão. Carinho e dor. Os palhaços seguem com suas piadas, trapezistas arriscam suas vidas, o leão ruge ao ser chicoteado. Andando na corda bamba seguimos vendados, norteados por nossos instintos rumo ao fim da linha. Uma pulga atrás de cada orelha, sempre flertando com o abismo. O público aflito torce por sua queda ao som de tambores".

 

Uma roda gigante de um parque qualquer brilha no horizonte escuro, as vezes se está no alto, as vezes por baixo, até que o passeio acaba.


2 comments:

Anonymous said...

Gosto da acidez das suas palavras, Carlos Caseiro. Consigo sentir sua embriaguez.

Anonymous said...

O caos era a ordem ...